Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Julho 12

Daí é que vem o nosso problema, caros caros amigos, até que ponto chegamos aos segredos alheios e os revelamos numa autobiografia?

No entanto, não seria um desgaste, que se por conta desses segredos a vida ronda, e ele não pudesse revelá-los?

O rico de certo não permitira. 2009. O pequeno sinceramente esperou e trabalhou enquanto isso. Mas como os fatos virtuasi interferem na realidade prática da vida. Ele, o rico, já havia lido de tão espetacular obra demoníaca.

Não, não, não. Dizia. Por telefone. Graças. Por telefone. Mas ele, o pequeno, investido de tamanha força não desistiu: confia. Foi o que disse por fim com sua voz doce capaz de suavizar o assassino mais violento daqueles dias de carnaval.

Voltemos ao ano de 1997...

Para onde iriam, o pequeno e o rico. Silenciosos entraram no carro e o rico, um tanto nervoso não sabia se sorria ou fechava o semblante em ares preocupados. Dizem que o amor de fato existe em algumas biografias.

Por outro lado o pequeno se admirava de si, sua própria ousadia e a própria ousadia do mundo que o desafiava. Tinha um jeito de querer fumar, mas escondia o gesto do lado direito do carro. As mãos bem seguras. Como se deve às vezes fazer. Eles tinham pouco a conversar, mas mal se conheciam. Talvez não precisassem, talvez não quisessem se sentir patéticos. O sentimento subia nas veias do pequeno que ele até se sentiu grande demais para estar ali.

- Eu acho que podíamos ver a cidade de um local...

- Há vários locais de onde se vê a cidade abaixo do céu, que eu pra lá quando não tinha carro. Quando ainda não tinha carro e sonhava em ter. Eu via a cidade inteira e esse céu que não sabe se cai sobre ela ou se a cidade é que cairá pra cima.

Se eram bem essas palavras, o pequeno não se lembrava, mas dava nesse conceito de que uma coisa era ligada a outra por dignidade pátria. E aquilo, já era indício, de que antes o homem sem carro, parecia valer pouco para andar pelas ruas muito bem distribuídas daquele espaço monumental.

De fato, ao longe, parecia um monumento único em que alguns habitantes da terra têm a sorte de estar.

Estavam felizes, porque a respiração se tornou voz, e finalmente começaram a falar. Entre uma fala e outra, um foi percebendo o outro, e as intenções que são segundas, de fato, em casos assim, seria um desrepeito o adjetivo, seriam mesmo intenções veladas. Próximas do medo no qual o desejo implica.

- Eu sei que tu não és tão amigo do meu irmão. Não podia ser...

- Eu achei que pudesse ser. Mas sair com voê num sábado à tarde não está sendo tão ruim. Eu acredito nessas coisas da coincidência e sinais. Li Paulo Coelho...

E riu. Ele contou de que tivera vida singular e média. A família mesmo começou ali, na construção da cidade e foi para onde os candangos iam que ele nasceu. Era o pobreza consumida de vontade pelas palavras de um presidente. Ele amava o presidente como amava a cidade, como filho das primeiras gerações do lugar. O resto de sua genealogia ficou no mato.

- Você sabia, que as famílias se perdem de verdade em tempos de grandes mudanças... não é?

- Às vezes eu acho que elas se aproveitam das grandes mudanças para se perder, isso sim.

E o pequeno riu e eles riram. Parecia importante ao rico contar sua trajetória. O lugar nem era tão distante da cidade, porque sendo plana, dava pra ver de vários ângulos dos muito pequenos montes que a rodeavam, onde se pára o carro normalmente ao namoro.

Não havia dúvidas ao pequeno de que naquela tarde ouviria muitas histórias do rico. Mas, incrivelmente, o rico é que lhe começou a perguntar... Era difícil ser jovem e responder à perguntas de que um adulto responderia com orgulho ou lástima de ter fracassado.

- Eu não sei o que falar de mim, tenho família aqui, mas minha mãe e meu irmão mais novo estão no sul. Estou de férias. E não sei do futuro: estou longe dele. Estou aqui agora e não sei o que dizer.

Logo os tremores. Logo a vontade de não falar mais nada, mas o pequeno não se atiraria ao rico. Ainda era preciso saber...

- Se você não é tão amigo do meu irmão, o que você iria fazer saindo com ele?

O rico, que sabia disfarçar tão bem quanto o pequeno, não respondeu, pegou em sua mão. Ele tinha os lindos olhos, mas na boca, algo que mentia, no seu silêncio e na sua atitude tão espontânea corria algo de esquisito, assim deduzia o pequeno, naturalmente acostumado às paranóias e sobrecarregado de pesos míticos. A reação do pequeno portanto foi de fingir que sua mão não esteve tocada e puxá-la de encontro a si, pedindo um cigarro, para fora do carro, onde pudesse respirar o ar seco daquele verão.

O pequeno sabia ser cínico e não queria. Quis amar aquele homem ali tão surpreendente, como diz a palavra e não como diria um literato ingênuo. Ali que ao sair do carro olhava-o de cima a baixo e vice-versa sem talvez saber da própria vida. Que homem rico e belo fazia com uma bicha de cabelo raspado e blusa rasgada vendo uma cidade íntima.

Quem virou as costas à cidade foi o pequeno. Daí o rico sorriu. Na verdade, o pequeno também não fumou o cigarro inteiro. Perdera a vontade. Coisa rara para o vício. O rico ofereceu uma bala.

- A gente até que está se divertindo.

- Eu gosto das tuas coisas óbvias. A gente também está se conhecendo?

- Tá, você não é hetero e nem é amigo do meu irmão. E eu não digo isso porque estamos juntos, já que vários heteros são legais e sairiam com o irmão gay de um amigo. A outra coisa óbvia e o que me passa agora pela cabeça é que tu sabes que é bonito e só me responde isso: você quer ficar comigo, é isso? Pois eu sou dado como louco. Se naquele dia em que fomos apresentados os teus olhos não se tiravam de mim porque eu também achei que podia te reencontrar novamente enquanto olhava pra ti o que podia, num breve e rápido aperto de mãos. Isso é óbvio pra mim. E qualquer coisa que se diga que eu viajei: diga, pode dizer, eu sei como voltar pra casa até e não tenho medo do céu da minha cidade. Nem de ninguém.

Não sei por que saíram aquelas palavras todas, mas nem o pequeno também sabia. Subia em si tudo o que lhe aconteceu na alma, dito no capítulo anterior, mais a paixão e uma vontade terrível de decretar o seu futuro ao mesmo que pensava: eu não tenho tempo para namoricos e processos duradouros, se o destino me traz o que eu queria, eu tiro a prova hoje, se o homem se assusta, a prova está dita. Acostumado a sofrer pelo silêncio de um amor de enganos, o pequeno assumia, pela primeira vez, a sua força de ter enorme coragem em se desprender. Ser livre ainda era o mais importante, e pensar que passaria dias e dias pensando naquele homem e tentando analisar cada coisa sua, gesto e toques, não lhe garantiria nada. Como no passado não lhe garantiu. Aí, talvez, é começou a fala e não terminou, até que o rico, espantado e horrorizado, talvez acostumado com conquistas e seduções muito bem feitas que ele certamente arrancaria de qualquer outro, pediu que parasse.

- Pode parar de falar um segundo?

O rico suava. Dava até pra ver que a sua origem de pais e avós pedreiros não suportaram o peso do inesperado pequeno, que se comprazia em ser inesperado a si mesmo.

Mas ficaram parados. O clima podia ter sido mais romântico e não tão duro que as verdades e coisas ditas assim imprimem. De repente é que o pequeno acendeu outro cigarro. O que lhe garantiria mais tempo. Nada de chegar perto demais nem tão longe que não o rico não pudesse sentir o cheiro da nicotina que lhe enjoava.

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