Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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sábado, 11 de julho de 2009

Réquiem 1.997

Vinte anos depois de nascido. Se é que história se faz de ciclos, aí está. O pequeno desde então viveu um sonho bom, mas era a sua história, era sua história.

Muita coisa talvez tenha passado desapercebido pelo autor, e muita coisa subentendido pelo autor, muita coisa quem sabe metaforizada por conta dos mistérios próprios de uma história inteira. Mas quem dirá então que uma história também não é feita das subjetivas formas de ficção.

Ao pequeno, pouco medo de se submeter ao universo íntimo em que vez ou outra emergia para dar provas de que sim, era existente, tinha matéria e um corpo orgânico que caminha por entre as ruas: chuvosas ou não.

Por que Personne brincava naquela nova manhã com um palito de dentes é que ele resolvera se lembrar do rico. Resolvera, pensem, como ele resolve pensar se o pensamento já não era algo a ser? Era assim com o pequeno.

Tirou o brinquedo da gata e pensou em cutucar-se um pouco as palmãos da mão, tinha a pele tão fina naquela localidade cheia de linhas e avisos. tinha um inúmero de memórias. tinha um inúmero de desejos: ainda. Matar o rico era difícil com todas as boas lembranças, a materialidade de suas vidas, o segredo ao qual se encarnara por si próprio, como se fosse boa aventura, ou bem aventurança, ao estar na Ilha não tocar seu nome. Os nomes não falados não são existidos, e as histórias, estas que ninguém precisava ouvir. A não ser o ouvido do rico precisava ouvir. A não ser no seu ouvido precisava lembrar de coisas boas que ele lhe dissera dos tempos bons. E por aí ficou.

Mas a saudadinha, esta palavra mórbida, naquele instante sim! mórbida, lhe provocava a ânsia de ter se enganado. Na casinha do nordeste, evitou tanto pensar que lá entrou: bem do jeito como ele queria, parece até que o rico sabia de como o pequeno gostava de se colocar nos espaços. Todas as lembranças daquelas fotos todas. O nunca inverno de uma região longe do sul. O nunca inverno, até nisso o rico acertara!

Quem era mais monstro afinal pequeno? Quem? E se tu não tem coragens de matá-lo em 2008, o que seria da tua vida depois disso: uma grande batalha com os ventos desta região pra baixo. Há paraíso embaixo do Brasil, pensou. Pensou e pensou e burlava em pensar, talvez tentando encontrar versos só para não distrair toda aquela angústia que se apodera da encruzilhada.

Mas o rico, o rico mesmo que desaparecia, por conta de uma briga, inofensiva, e que sempre fora assim, de lhe pegar quando bem quisesse, acaso na casinha vossa seria diferente? Tu ficarias lá, pequeno, menor ainda, e não verias outra solução a não ser esperar que o rico, por endereço certo e por ter tudo certo, bem do jeitinho que queria, lhe pudesse ter e se dispor do teu riso e até das suas lágrimas. Parecia mesmo que sabia quando chorava e que gostava de lhe ver sofrer. Mas essa não era a parte monstruosa, porque é natural que o ser humano vez ou outra goze da dor de quem ama.

E tivesse toda a inteligência para falar dos ódios e suicídios, e tivesse toda a inteligência para enredar nós, e concretizar até personagens bem gordos e feios. Tivesse, não naquela hora. O momento do palito de dentes que nem chegava a ferir as mãos, porque a pele, embora fina, era resistente à picada.

Só faltam dois dias, este e mais um, para o final do ano, e para o final desta obra também. Sorria. A esperança que era inimiga, por que nunca passaram um final de anos juntos? Por que nunca nunca iriam passar. Porque era orgulho demais. Dois orgulhosos obesos de si. E um amor inacabado. Talvez ficasse deste jeito, parado no último instante em que se olharam pela última vez que tinha sido amarga não fosse o efeito do remédio rosa acalmando os nervos e os cuidados.

Era melhor ter-lhe feito um novo carinho, ter-lhe seduzido novamente, ter-lhe abraçado gentil e aceito a proposta, ainda que a protelasse.

Por que da alma vem certas éticas como vem de ódio também? Sim, porque está tão escondido quanto os sentimentos vis, essas coisas que a gente também tenta esconder para não parecer piegas diante de um mundo caótico e aparentemente contemporâneo, contemporâneo de erros, quem saberia.

Ao rico pouco importava estas questões, posto ser questão de posse. E isso era tão medieval que chegava a deixar os olhos do pequeno bastante sinistros. Quais eram as coisas que o pequeno não queria ver do rico, que escondera naquele verão lindo, que fizera questão de arrumar sem notar as notas, os nomes, os relatórios e as fotografias?

Eram metáforas, nada mais, coisas que o pequeno não precisava saber. Ele, elezinho tinha claro em si que não lhe interessava saber e que não precisava saber, e que se o seu homem lhe dizia: és meu segredo. Como segredo não deveria se comportar, se havia amor?

Quando começou a escrever o Perverso, a segunda obra gay, tinha tanto de si e dele, tinha tanto do que imaginou fosse bem para ambos. E desaparecer, mas não, tinha agora endereço fixo, e fixaria ali seus pés, suas letras, sua história novamente. Não viveria mais de lá pra cá em busca de não ter no que pensar ou a quem fugir.

Fugira de saber quantas verdades? Porque ao se desligar a tv, é uma decisão muito importante não querer mais se informar e dormir em paz. Não é?

Bom que o pequeno tinha seus videogames. Voltaria ao ano que se conheceram para aniquilar da memória tudo o que lhe acontecera então e bem definidamente traçar um novo ano, como fazem os mortais de coração. Posto o coração morrer por metáfora, ou morrem certos amores, por que não morrem então de velhice?

Já caducou a espera e o encontro e os personagens caducaram em suas éticas e moralismos. O pequeno não era moralista, mas ao ver ou ouvir, ou não-saber do que era feita a riqueza do rico, tinha sim um certo pavor ou um ímpeto estranho de moralizar o mundo.

O telefone tocara várias vezes, no seu celular, e era ele. E enquanto tocava o pequeno pensava que venceria: não, não desceria as escadas da grande vila ao encontro do seu grande amor, porque não era grande um amor feito de covardias.

Deitou no chão bem rente e o telefone parou. E voltou a tocar. E parou. E voltou a tocar e parou. Foram cinco vezes que o pequeno matara o rico.

Lamentou sentir certo ódio e dormiu.

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