Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Julho 5

E me disseram que o pequeno não, jamais, envelhecia por conta de reter o esperma.
Parece-lhe que lhe causa mais prazer ter-se bem intocável e fruto maduro: como normalmente acontece com certas ilusões.

Por onde passava tinha um sorriso sincero e tão acolhedor que para alguns causava medo. E é só neste capítulo em que me encontro diante dele: eu também sinto medo.

Nunca saberei o que se passa quando ele sorri ou quando traga o seu cigarro maldito espalhando fumaça mas com as mãos tão gentis e palavras tão doces que me encantam, que me envaidecem e que me tragam.

Mas esta é uma biografia. O que ele faz ali? Personne, ele chama e faz um carinho breve. Nem na sua própria gata ele mantêm mais que um minuto de leveza. Porque é duro. Tem o coração daquela rainha inglesa. E age ora como diana e ora como demência.

De fato, passara muito tempo deslizando as mãos na parede e acariciando sim sua sombra distorcida. Muitas vezes gargalhara sozinho e dançara com as mãos feito indiana. Pobre bicha. Pobre bicha.

Mas ele tinha uma clareza. Tinha uma definição de si mesmo: o que ele era se não fosse obra humana. E nem foi fazendo teatro que descobrira isso, foi tendo doído e doído tanto que poucas vezes na vida sentira medo (depois dos vinte e poucos anos).

Uma vez lhe causou pânico não ter controle e não ter sentido, no sentido de direção só sabia guiar linhas tortas no papel e escrever mil bobagens. Só muito tempo depois é que passara para seu micro (um micro velho para aquele ano de 2007).

Mas não falemos em anos agora, falemos de suas tragédias e de como ressucitava sempre invicto de maneira que a tragédia era burlada.

Então, era burlesco, então ele era o comediante de comédia, não da vida. Porque também tinha esse dom: de espantar mosquitos apenas negando-lhes atenção. Alguns diziam que não: que era justamente o oposto, dando-lhes muito sangue ele sentia prazer em ver sobreviver de si bicho tão inseto e irritante (bastava que não abusassem demais de seus ouvidos).

Era assim também com o gato que pegara para criar e que era sujo e mal-criado. Não, não era Personne. Personne, linda e admirável, que até cometera suicidio e saíra ilesa: pois desde muito cedo ele a ensinara a pular e a sobreviver com a dor. Na verdade, bastou-lhe algumas gotas de novalgina de gente para aguentar uma noite com a pata em fratura exposta.

A sua fórmula era incrível: com muito esforço encontrara a saída, e agora falo sério em ter tamanha confiança e ao mesmo tempo uma humildade incrível. Ele sabia as palavras certas e sabia também que o mais importante de tudo era continuar espontâneo.

Difícil arte, não? Era isso que o feio temeu durante muita vida. E desperdiçou até. E chorou, toda vez em domingos ele ainda chora. Pensa que tudo deu errado. Pensa que foi um covarde. Que tudo o que fizera para afastá-lo foi certo e decidido e tão decidido que dava provas de não ter sido amado (e amável). Numa jornada de suores acabou encontrando paz. Mas paz não se mantém por muito tempo se tem a garganta entalada e a velhice próxima.

- Se não colocares um filho no ventre, meu filho, tua história será de misérias.

O feio se revoltava, porque não aceitava frases prontas e destinos prontos, ao mesmo tempo só sabia suar e perpetuar suas próprias fantasias nada empíricas. Tinha um lado romântico que ninguém sabia. Guardava uma rosa dentro da cabeça. Tinha uma voz que era muito brasileira e que lhe ria em dias de insônia. Esta que igualmente ninguém via. Fingia dormir quando estava acordado demais em pesar seus sofrimentos. Sem se levantar para não causar suspeitas.
As suspeitas sim são o início de tudo e toda fantasia: social. E demorou, talvez nem nunca soubesse que aquele seu primo tão machucado e ferido que ele mesmo defendeu ou tentou com unhas mortais e masculinas defender das garras do pequeno, aquele seu primo na nossa história seria chamado de louco.

Então porque é sempre assim em toda história: havia o pequeno. Havia o feio. Havia o terceiro personagem que ainda não tenho adjetivo. E havia o louco. também outros adjetivos menores: como os irmãos e como as medalhas.

Amigos? Será que um dia tiveram algum que pôde mesmo compreender a extensão de duas cidades construídas por cima de terra falsa? Ria o pequeno de tudo isso quando se deu conta passado os oito meses sem que se viram. Ria o pequeno de tudo isso quando se deu conta que o sofrimento era algo a ser dissecado como o amor.

O que lhe doía mesmo era um certo trauma e horror daquele outro homem. Conhecera numa de suas viagens de fuga. quando se deu conta de que sua personalidade tinha sido construída por um engano fatal (engano dos fatos) não lhe doeu em nada, afinal sabia lidar com formas amorfas e distúrbios, mas a realidade limpa, limpa mesma de um espírito limpo que ainda havia dentro daquela alma: esta ele mesmo castrou.

Sejamos breves: após o marcado desencontro: - não, não posso falar com você, disse o feio. E o pequeno desligou o telefone e prometeu com todo orgulho possível (e era muito) que jamais voltaria a cometer esse crime hediondo de auto-traição. Trair-se e ser jogado ao silêncio inconfuso nem ondas vinham para lhe causar movimento em superfície alguma.

Passou dois anos indo e vindo daquela cidade até a cidade natal, onde não enlouquecia ou quando não escrevia nada. Foi por aí que encontrara o príncipe? Não, porque príncipe de princípio já lhe fora furtado.

A verdade não vem com o processo? Dois anos se passaram e ele não podia ter imaginado que viria, sem que buscasse viria um outro homem: tão lindo e amável e adorável, mas tão cheio de segredos, mais que o pequeno engolia, parecia! mais muito mais! que adjetivo daria senão... o rico?

O tal rico esteve em todos os lugares que ele foi depois de se conhecerem, porque era rico. Oras, a riqueza compra até o espaço geográfico de quem foge. O mapa se desfaz ou refaz de acordo com o seu mando. Rico. Este rico além de mentiroso tinha a pele macia e lhe prometia um mundo de vaidades incoerentes. A alma do pequeno já não era bastava de não ter coerências? Já não se fundara ali uma cidade inteira de insanidade inteligente capaz de mostrar os dentes por agrado sem a menor culpa? Até por que lhe causava mesmo prazer agradar aos outros: e isso não era maldade.

(Não falemos de maldades em histórias de amor. repetiu três vezes enquanto escrevia).

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