Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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terça-feira, 7 de abril de 2009

Rio de Janeiro XIII

Enquanto nas duas semanas intensas: os nossos personagens se complicavam e criavam um modo diferente de estabelecer relação, as dunas do sul sopravam no alto verão e na cidade natal do pequeno, como era de ser naquela temporada: as ruas e os palácios vazios. Tivera saudades.

A segunda semana o pequeno diminuíra as visitas. Agora era necessário tempo. E a mensagem do rico lhe veio em celular que não imaginava que fosse trocado por um pé rapado doente. Estava feito.

Do rico livre. Era continuar a história até que o ranzinza finalmente voltasse à São Paulo. Naquela semana, não sabe-se o que houve, mas a amiga ficara chocada com algo: talvez o amasse, o razinza, talvez se sentisse traída por ter, no fundo, aproximado dois seres tão diferentes, o imprevisível a chocara, e o ranzinza começara a dar provas de que a relação entre os dois não estava bem.

Estava ficando insuportável na companhia de uma amiga que não cuidava dele, como um estranho cuidara. E, parece que foi, ao falar mal do pequeno que o ranzinza se ofendeu e revoltou. Tinha também um caráter firme. Na sexta-feira última, já melhorado do braço, já com o rosto menos inchado, decidiu, por insistência do nosso anjinho ficar em Santa Tereza.

Daí sim correu lascívia. Daí sim, o herói cedeu de corpo nu, bem nu, tudo o quanto fora travado naquelas semanas quentes, e por isso mesmo de coito, que o ranzinza reprimira por força da cidade (e do pequeno). Ali, no quarto com seu amante agora, não era amigo, nem alguém que o cuidava rompeu todo o seu rancor e amargura em sexo: oral, anal, sexo, oral, sexo, poucos beijos, quase nenhum. Tinha medo dos afetos, como acontecera naquele sábado não permitiria mais: era invadir demais a alma.

- Eu não sabia o que você queria de mim naquele dia. Ficou me tocando...

- Mas não é bom tocar.

- Mas tem que ser assim, ó! É sexo, porra, é desejo! Tu és frígido.

- Sou.

Mas deixou que o ranzinza fizesse o que quisesse de si.

- E esta tatuagem, o que significa?

- Nada.

- É coisa de gente bizarra.

- Sou eu. Se quiser pode até, na hora do gozo, fazer um pedido. Acontece, quando acontece, acontece.

- Tu sabias que tem algo que te rodeia, tem algo que te domina, tem algo no seu quarto, tem algo que não tinha lá na casa da amiga. Aqui tem o teu mundo: e ele é sombrio.

- Agora você virou vidente? É espírita? Entende de coisas e energias?

- É sério, porra! Eu sou sim, e daí, não significa que eu seja mais burro. Mas não vou falar disso.

Aquilo deixou o pequeno intrigado, mas não era o primeiro a ver dessas "coisas" nos universos que o pequeno criava, ou circundava, ou evocava para ter a alma mais limpa. Sobretudo se era hora de o corpo gozar.

E das poucas cartadas românticas de seus diálogos disbaratados houve esse: de que nos encontraremos, sabia, em todas as cidades que nós vivermos.

- Por que fala isso?

- Porque não fico mais no Rio. Não te contei. Mas não fico. Vou até abril apenas. Mas daqui dá pra te encontrar em Sampa, já será a segunda cidade. E nos faltará o sul, onde nos veremos. Eu sei que sim. E será uma bela história de amor, não acha? Encontros em cidades vividas. Coisas de amantes modernos.

O ranzinza desconfiado e mesmo carrancudo: ficou todo bobo. Todo mundo quer uma história assim. E: aconteceu.

Ao menos nem um nem outro poderia dizer que não. Embora no íntimo de cada um, a verdade fosse bem diferente nos encontros que voltariam a ter.

Na despedida, o ranzinza fez prometer que iria mesmo esperar pelo pequeno: o lugar é pobre, é bem no centro dos orientais, é uma quitinete, também é quente demais, mas vou tentar ser o melhor anfitrião, prometo.

E até que chegasse o carnaval, de janeiro a fevereiro eles se falaram por telefone, por amor e carinho que aprenderam a criar.

Mais provas dás ao rico, pequeno, e isso não impede de ter esperanças no monstro grosseiro que se transforma aos poucos em algo gentil e grato por ti.

Trabalhou para ter bastante dinheiro e começou a espalhar devagar a vontade (antes da notícia) de que não ficaria no Rio por mais que um ano. O que deixou alguns patrões preocupados e amigos também.

Em São Paulo, o pobre do ranzinza, sem muita grana, conseguira comprar pelo menos algumas coisas de 1,99 para dar mais conforto ao nosso visitante. Será mesmo que ele iria? E até uma almofada confortável. Ingenuidade e bobice de alguém que foi tão ríspido no início da vida.

Mas que não era amor, amigo, pensava o pequeno dentro do ônibus que chegaria a cidade enorme. Sozinho assim, o pequeno temia, tremia um pouco: pouco conhecia a São Paulo dos cotidianos. Tinha mais medo dali que do Rio, em que dominava com a palma das duas mãos, porque era grande o Rio de Janeiro.

Talvez sumir numa quitinete e não voltar mais fosse um gosto de pensar e se imaginava em outra vida, como era de seu costume burlar a antiga enfrentando uma nova: imprevista! Pensava menos no ranzinza e mais em si, na aventura cabida: que era o gozo do nosso anjo arriscar-se à si.

Antes, uma noite antes de pegar seu carnaval com o seu doente curado, houve a discussão pelo telefone: o rico incoformado, nunca o vira assim, e viria novamente, mal sabia, pois bem, nunca o vira tão irritado. Você tinha razão, você nem me enganou e nem isso posso te jogar na cara.

- Pára de vez, meu rico, meu deus do céu, quando vai acabar a nossa história!?

- Isso não vai dar certo, você sabe disso, antes um rico como eu, do que um caipira pobre!

- Vai dar certo, sabe por que? por que você sabe que eu não planejei só isso.

- Eu mandava te raptar no meio da estrada, num posto de gasolina, mandava um monte te pegar.

- E depois? Colocaria fogo no meu passado, faria a crueldade se estender aos desesperados sem notícias de mim?

- Como se tu mesmo se importasse algum dia com alguém que lhe fosse caro.

- Me importei. Me importo. As pessoas se preocupam, já não basta? Mas não fugir e desaparecer pra sempre. Se nem você teve essa coragem?

- Você quer viver comigo?

- Estamos em 2006 e eu ainda não sofri o que pressinto. Sofrer sem ti é me fortalecer também e forte vou poder ao menos te fazer feliz, que meu espírito é todo enlouquecido por idéias e fantasias e por histórias que nem completei, sabia? Sabia, se te interessa saber, que meu último romance faz dias que não escrevo.

- É que fica pensando nesse rapaz.

- Não como penso em ti.

- E por que me falar essas coisas. Tá vendo, você me ama.

- Eu te amo.

O pequeno nunca mentiria nisso. Mas continuou firme nas suas decisões. Chorou e gritou com o rico que parasse de vez: deixasse, então ele, a cidade encantanda e os prazeres encantandos da nobreza em que vivia para ter uma paz criada por eles. Seria outra paz. não a paz que é conceituada por aí ou por essas tolas religiões. Seria a paz deles.

Mas do rico não ouviu recíproca. Só um silêncio e um soluço. Desligou o fone, por fim. O que lhe aconteceria era coisa dele: somos adultos, ergueu a cabeça o pequeno.

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