Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

Páginas lidas

segunda-feira, 9 de março de 2009

Rio de Janeiro

Não tinha mais tempo. Aos 28 anos estava no Rio de Janeiro, a cidade do calor em que ele pensava o tempo inteiro: e se nevasse por aqui?

Não tinha mais sonhos passionais. Estava no Rio de Janeiro. A fuga pelo escape imprevisto. As mochilas nas costas magras. Estava de fato na maravilhosa angústia da sua última perdição.

Ele prometeu apenas que da sobrevivência faria novo claustro e forte, fortíssimo, não ressurgiria nunca. Apenas para demonstrar a si mesmo que o tempo causador de feridas é que, geograficamente, ele domaria e faria se curvar como um deus predestinado a aniquilar o passado.

Vimos que o nosso pequeno não era um herói, mas um grande sátiro, se assim se pode chamá-lo. O rico nunca entenderia e nunca entendeu de fato: por quê?

- Porque no Rio eu tenho um Cristo bem grande e de todos os lados, eu ouvi dizer, ele pode ser visto e de todos os lados, meu amor, ele abraça a gente no calor insuportável que lá dizem que faz. Porque está lá. Porque o Rio não tem nome de Rio mas de São Sebastião.

A mudança repentina aconteceu em menos de um mês. A mudança de estado para um estado outro que burlasse as leis da fatídica história. Ouvira dizer daquela teoria: nada é tão contínuo, nada é tão cíclico, nada é tão casual, há que se fazer estrada por si, e esta é a alternativa imprevisível do qual os homens temem e se fascinam.

Praticamente escolhida na tela do computador depois de ver algumas imagens de uma amiga no seu orkut, depois de ouvir milhares de contos assustadores de covardia, depois de ouvir sobre as chuvas intermináveis de pingos gigantes que por lá caíam. Apontou o dedo no mapa do país... para algum lugar iria, ao norte e nordeste não, ao outro Santo, nunca! Porque Paulo era nome de discípulo estranho aos seus ideais crísticos. Porque Cristo, meu amor, ele repetia, está com todos no Rio de Janeiro.

Uma perversão da realidade, não da lógica, se pode-se acusá-lo de algo. Coitado de ser pequeno e de não carregar cruz nenhuma. Era a sua glória, poder então ajoelhar-se, nem precisava, apenas sorver, sim e morar como morou nos primeiros dias numa das ruas mais famosas do centrão, quase lapa, onde a boca de fumo mais tradicional, diziam, era feita por todos aqueles adolescentes muito mais fortes do que ele. Risível, ele se tornava, e risível cada vez mais, ele se sentia, pequeníssimo e forte, tal como os que não são nada.

Ser nada, no entanto, era o esquecimento. Era assim que via. Como vivia e tinha força por ser nada! Era o que lhe brilhava e clareava tudo num não precisar ter coração. Tinha um corpo para cuidar no caos que era de cimento e cheiro de podre, o bafo que lhe deixava os óculos tão embaçados. Saíra num dia qualquer e não se perdera, percebera que a cidade era redonda, tão redonda quanto o centro desses furacões vistos por filmes realistas.

Os mendigos em grande quantidade lhe traziam a poesia necessária e cúmplice. Nunca teve coragem de perguntar - mas quase o fez: vocês também se esqueceram?

Era a revolta contra a cultura toda e tudo o histórico e tudo o banal que todos os livros lidos e toda a coisa adquirida, arte mesmo, não lhe deram nada. Nem base cabal de ser livre. Nada! Tinha revolta. E se voltava ao deus do céu que o tornasse menos humano, se humano era ter tantas crenças infrutíferas.

Fortes eram os viventes de sujeira e pó de urbanidade e sempre, todo dia, sob o sol mesmo ou a meleca da chuva escorrida, ratos e outras coisas mais nojentas, todo dia acordavam na mesma calçada.

E tudo isso dentro de uma paisagem dita exuberante e mesmo de verdade era. O centro urbano era minúsculo demais aos pés da paisagem. A violência, quem a via, com mar tão azul e pedras gigantes como aquelas ou mata atlântica ainda fervida de seu verde-serpente.

- Talvez eu nem volte a te ver. Mas foi bom até aqui.

Nem cultura, nem idéia alguma o prendera.

- Eu tenho o mando sobre mim.

Era a última vez, pensara que lhe responderia ao rico. Era a última vez de uma aventura sem planejamento nem causa. Parecia até que se tivesse nascido de uma bruxaria era ele o feitiço de si mesmo que lhe causava o êxtase de prever sobre si, não sobre os fatos em si.

Marcava bem que ao chegar na cidade escolhida já não se lembraria dos horrores da contradição que o amor lhe sucumbira.

Era o ano de 2005.

Um comentário:

  1. Eu só não sei, se ele descobriu com o tempo que o grande Cristo, vistos de quase todos lados da Cidade Maravilhosa, não abraçava a todos

    ResponderExcluir