Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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quarta-feira, 4 de março de 2009

Julho 14

Pequeno, pequeno, quantos anos tinha para acreditar no amor? Ou era mesmo verdade embora não fosse pela noite inteira. Ainda conversaram? Não mais tanto assim, porque se conhece a carne como carne e isso já os bastava.

Não era meia-noite ainda quando voltava à casa e saía daquele carro. O rico segurou bem forte em suas mãos e pediu com a outra um pish de sigilo. Mas continuou segurando forte, queria mesmo largar? Queria mesmo deixar o pequeno subir? Ou quisera mesmo dizer coisas do coração.

- Quando isso acaba?

E ele sempre tinha uma saída não era? Ele, o diferente dentre os diferentes, sempre tinha um olhar claro e se o rico lhe jogava a dúvida, embora o tivesse amado e estivesse querendo a solidão de sorrir às paredes do quarto só! E curtir só que era verdade, embora assim, colocaria em cheque ainda o desejo ou o mistério, ou a fantasia e o medo. Não soube bem o que responder, lembrou-se da infância.

Lembrou-se rapidamente de um dia no shopping em que se perdera dos pais e via apenas a sua mãozinha para cima como se segurassse a mão da mamãe ainda... lembrou-se que perdeu seu tato e depois era a sua mãozinha e as outras pessoas estavam muito longe de seus olhos... eram tão altas. Mas continuou caminhando daquela forma até que alguém o percebesse e o pegasse em seus braços. Ele disse pro guarda que o acolheu: eu tava com o braço cansado...

- Quando eu era criança havia sido... só acaba quando o demônio desistir de mim. Mas por incrível que pareça, meu amigo rico - e conseguiu tirar suas mãos - eu creio muito que ele desistirá um dia. Não sevem para isso os anjos na terra, por serem o terror do mal? Não é isso que fará que ele, o grande, se atire aos pés de deus e deixe seu trono a nós? Um céu no inferno: é quando acaba.

E em vez de uma despedida na boca beijou-lhe os ombros, isso para aproximar mais uma vez as narinas daquele perfume... que ainda sentiria em 2008.

- Eu vou te procurar de novo, disse o rico, não se preocupe, quase sorrindo.

Fosse a primeira vez que não pensasse nem chegasse a se lembrar daquele monstro que era outrora amor. Não ele, que por si só já sabemos de sua autodefinição. O pequeno, naquela noite nem sequer dentro de seu mais profundo esquecimento se lembraria que houve um dia um trauma que ele, imaturo, chamou de primeiro amor. O rico o beijou, ele o abraçou, ele o entendeu quando nada foi penetrado naquela noite a não ser pelos olhos e a saliva que se penetra sem controle algum, ele o agarrou e o pegou pelos braços. O pequeno, nosso, um dia sorriu daquela forma toda de quem acabava de nascer a sua segunda vida. Não se lembrou de escrever poesia alguma, era fato de muitos poetas não escreverem em dias de êxtase.

Não quis dormir e respondeu ao irmão coisas banais de como tinha sido aquele longo dia, caminhando pela cidade de prédios muito bem feitos, dizia muito.

E com os dias, com os anos, o irmão e o rico nunca se tornaram amigo, e o rico se afastou dos amigos dos amigos do irmão e sucessivamente até que existesse entre os dois apenas o degrau em que eles próprios se consumiriam. Talvez o pequeno houvesse aprendido tal disciplina porque o rico já era desde então mais sábios nessas questões.

O que os romancistas sempre tem de agonia entre os casais de amor é decifrar o que fazem quando não estão juntos. Por outro lado quando estão é permitir que ambos se dediquem numa sinceridade tão profunda e tão compartilhada que acabe por estragar o romance. Porque depois, na próxima vez que se distanciam, haverá análise e dúvida ou puro ciúmes disfarçado. Sei sei, não há processo claro nem evidente, etápitico para as paixões e seus movimentos. Mas tentemos um pouco nos iludir que sim.

O que o pequeno soube do rico é que após aquela noite alguma coisa lhe aconteceu, soube por seus lábios os vários encontros que tiveram que um sentimento até muito nobre era capaz de o possuir, ele que até então pensara numa subida muito clara, em objetivos muito próprios ao lado de um caos minúsculo e sórdido? Quantos futuros cheios de graça teriam juntos?

Não, não importa disso, dizia o pequeno em suave contemplação. É agora...

E finalmente gozarando sobre si mesmo é que efetuaram o pacto. Nada de sangue. Era com esperam que selavam o futuro de seus corações.

Em 2008 aquelas lembranças não lhe torturavam, acariciavam suas angústias e delas, das lembranças e angústias juntas nasciam novamente um ar de felicidade. Serenidade em vez de fracasso. O que era de fato a vitória de uma inevitável tragetória de solidão.

Estava correto que o rico, mais rico ainda, muito mais, o procurassse ainda e ainda mais o pedisse em casamento. Estava correto que o mais rico ainda ainda assim vendo-se na conquista de tudo o quanto sonhou não percebia que ao mesmo tempo, na longa tragetória tida, sonhou e conquistou também o pequeno. Longe e com tantas coisas a sentir. Coisas da gratidão, como se ousasse ser velho e sucumbir nessas delícias da memória.

Foi o ano que mais se olhou no espelho e tinha orgulho que sua pele tivesse permanecido intacta de tanta história e queem suas linhas da mão apenas estava escrito: dorme, dorme e espera.

Fora o verão mais bendito. Fora quando ao menos tivera a certeza de um amor real e verdadeiro que de tanta verdade não era questionada nem necessário era, sobretudo para quem duvidava tanto que um homem pequeno pudesse ser de fato feliz.

Como fazem os enamorados, planejaram mil coisas e no dia de sua volta ao sul, o pequeno não chorava nada, apenas ria e sorria e prometia ao menos não esquecer daquilo vivido. O rico, estacanva um ar de quem era libertário e libertador, livre também: conseguirei tudo e te trarei de volta pra mim.

Dormindo no avião de volta foi que pressentiu o calafrio de um cochilo rápido e o seu espírito que era transparente no céu da cidade capital ia com a velocidade da máquina voadora tornando-se densa, talvez preparada, para a ilha das feiticeiras. Sonhou um daqueles sonhos: volta, dizia, o seu enganador feio, volta... E acordou. Não, que pena que não era a sua segunda vida. Isso só acontece com os espíritas.

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