Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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sábado, 28 de março de 2009

Rio de Janeiro IX

Não é porque gosto da cristandade, mas são as referências que nos contextualiza, e o pequeno, que era humano demais até aceitava isso de bom grado. Como filetes de luz entram e deixam a penumbra um tanto mais preenchida.

Apenas pensou que, por ser voluntario, da ação caridosa, provaria ao revoltoso doente de ser desnecessário travar guerra. O revoltoso doente, no entanto, mais impressionado ficava com a persistência enérgica e o carinho e a voz de quem não presta atenção ou finge não ser maltratado.

- Sim, estou santificado. Não espero de mim maldade ou ironia. É preciso antes cuidar do seu braço e na minha companhia quem sabe o Rio não te pareça esse infero do qual reclamas tanto.

Assim, começou aquela amizade. O pequeno não o achara feio, nem desinteressante, mas passou pela sua cabeça que jamais ou que infeliz pudesse, gostar de um gay tão rude e que gostava, além de tudo, de ouvir mesmo seus clássicos, dizia, antropológicos, ou coisa assim. Eram as piores faixas que um gay poderia ouvir, por exemplo, das duplas sertanejas aos sucessos antigos e batidos de franceses... Se tivesse quarenta ou cinquenta anos! Até se sustentaria. E mais novo que o pequeno e morando na escandalosa capital universal dos punks-rocks aquele ranzinza nunca entrara numa boate?

O destino, mais que o tolo, é que desafiava com riso irônico das habilidade mais humanas de nosso personagem. E quem venceu se não o nosso personagem. É claro. Durou duas semanas que narrarei aqui em alguns detalhes para não nos perdemos demais.

Saibam apenas que no carnaval mesmo, depois de curado no Rio e de volta a São Paulo, foi que o tal grosseiro, é como o chamarei, recebeu o pequeno todo bobo em sua quitinete pobre do centro paulista.

É importante dizer duas coisas: ao pequeno, acostumado a ondulações bastante claras das classes sociais do país não achava pobre a quitinete, a pobreza talvez viesse de espírito tão bruto que nada tinha a ver com as delicadezas próprias do nosso fingidor. E outra, tolo, não por que o pequeno assim o considerava: mas era o destino, tal grosseiro, tal, o destino que nos quis em tolice para o que nos virá e não sabemos ainda, pensou pequeno.

Porém, vamos traçar um ritmo mais alegre para essa história. Embora já pudéssemos pressentir seu fim (que não foi tão curto, adianto), podíamos ao menos dar-lhe o toque exato da comédia romântica que se seguira.

O doente rabugento e grosseiro, mais novo que o pequeno, e o pequeno, um ano ou dois mais velho, mas com seus ares de moça rejuvenescida e bondosa. O doente nunca havia pisado naquele solo cristão; o pequeno, por outro lado, apenas sabia que embora fosse maltratado por quem lhe desse gratidão: era um desafio. Ser voluntário é isso. E nada mais. Que as manchas de seu rosto aos poucos passassem, talvez lhe tirasse até um riso do rosto fechado.

- Está muito quente aqui reclamava, e a amiga que não chega nunca? Você me fez esperar horas na rodoviária.

- E você ficou com vergonha.

- Claro com esses hematomas! Queria o quê, bicha louca?

Fingiu não ouvir.

- Aqui perto tem um super-mercado eu irei até lá. Me acompanha.

Do alto daquele pequeno apartamento onde estavam. No início da história, dava-se pra ver toda a fuligem e o sambodrámo. E dava pra ver a Avenida Brasil inteira com todos os seus carros e barulhos. Era lindo. Mas não para o ranzinza.

- Você não acha mesmo o rio maravilhoso com tamanha fervura? Ainda de noite quase dá pra ver a fumaça saindo.

- Eu não vou a supermercado nenhum. Aliás, me deixa, não vale a pena me ajudar.

O braço quebrado.

- Vale sim. A amiga me pediu e só saio daqui para ir ao supermercado e depois eu volto e espero ela chegar. Logo estará aqui.

- O que você vai fazer?

- Vou comprar um vinho para comemorarmos a sua chegada, ué?

Comprar um vinho? Um vinho? O nosso amigo se debateu: era louca a bicha mesmo.

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