Pequeno Prefácio do Autor

2008 é nome da obra em que me insiro num universo da passionalidade ficcional.
Não sei se ao leitor agradará o ritmo e os recortes ou os possíveis surgimentos, sei sim que entre a verdade e aquilo que inventamos há um universo inteiro: é nesse universo que estamos no ano de 2008.
Prefaciando cada capítulo meu, encontro Waldo Motta, poeta dominador de almas que é.

O último capítulo Réquiem está na barra acima por um motivo último.
Os capítulos são interdependentes podendo ser acompanhados sem ordem ou pela ordem do leitor.

Classificação etária: maiores de 16 anos.

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domingo, 21 de junho de 2009

Orquídea11

O que o deixaria feliz era se, passado julho, tivesse continuado feliz.

Os dias que carregam novos dias. O novo sempre a espreita. O novo de novo num século tão cansativo de ser retransfigurado. Quando acabaria? Quando acabaria com o pequeno? Quando retornaria a ser uma tradição única e possante? Todos.

Ao menos, vez ou outra, o pequeno se atinha à essas coisas do espírito ideológico. Até ficava feliz por ser um tempo não pensar em si mesmo. É bom não ser egoísta todos os dias, pensava alto. Muda o mundo se pouco conseguia mudar do seu destino. Seria de fato algo glorioso, como a própria palavra que a gente esquece o teor de tanto usar: glorioso.

E já que agora havia concluído o Orquídea Fantasma, estava mais puro? Não. Nunca estivera puro. Entre os meses de criação ele criara o Almas Gêmeas, esta obra que se tornou um pedaço do seu espírito poliana e também, mais real nas suas estruturas, lhe dera um certo apoio e uma dica: ao final, alguém será capaz de compreender o final da história. Certamente, o Almas Gêmeas não tinha nada de gêmeo, tinha era perversidade subentendida na plataforma das culturas humanas: as culturas humanas predestinavam os destinos individuais. Quantas droguinhas foram capazes de aplaudir contigo esses enredos, meu pequeno?

Ousou pensar em 2028, quando, aquele justo ano de 2008 estivesse vinte anos para trás. Passado assim, é tão passado que da gosto de vê-lo entreburlado pela memória. Ninguém precisa de provas de nada se a memória falhará! A, por certo e que delícia, se deliciava o pequeno. A sua memória falharia até mais vinte anos e ele ia até lá pra não provocar tumores em seu ombro.

É que ao escrever, imediatamente, lembrava-se do rico. Vocês se lembram do rico no início de Julho deste romance? Vocês não se lembram do segredo do rico que não fora revelado. Certamente o segredo do rico não era apenas disfarçar-se de hetero. Este é o normal de todo o iniciante. À carreira do amor é necessário preparo: para tudo abrir. Senão, é como a história se tornar um jogo de diálogos mentirosos. Uma mentira levando à outra. Quem é que acaba com isso?

Ser amado ou amar. Nenhuma das duas orações é posta em cheque, quando se de fato sente. Sentir. Verbo existente de que se existe pele. Pra isso foi criado o verbo. Não é nada dramático, quando se pensa assim. E pode ser até pueril: mas assim é e graças ao homem foi pensado e expressado por humanidade. E o medo? E as aflições? E as perturbações paranóicas da perda?

- Eu te perder não é pior do que este tempo inteiro, disse o pequeno um dia, com os olhos pregados nos cílios de si mesmo, falava ao rico, num verão em Florianópolis. Sabe-se lá qual deles agora.

Eram tão belos os seus encontros que a última vez que se viram. O tapa na cara e o copo quebrado. Aquela violência física pouco era pertubadora da felicidade das lembranças boas. A maldade então estava no pequeno o tempo inteiro? Só por conta de querer sua vida própria. Não era pra ser assim? Casa própria, independência própria, próprio riso.

O que o rico lhe fez em seguida, quando chegarmos ao próximo capítulo, foi menos doloroso que as decisões íntimas do nossozinho. E em todo caso, considerava, muita coisa já havia sido escrita. Estar louco ou ser são não era algo a se pensar. A se definir. A se clarear. Amar era tão bonito sozinho.

Flor. Curtiu. Desgoutou-se cada pétala - ou página. Esperou o outono, como vimos. Esperou que o inverno chegasse pra ter coragem. Mas o inverno já havia passado em 2008. Ele enfrentara o inverno. Julho alto. Julho tão cheio de intrigas que à ele nem fora mês. Era muita coisa pra se pensar num cérebro que cabia na palma da mão, por exemplo, de um grande homem.

A casa esperando no nordeste. Um ódio crescente pelo rico, um ódio nunca existido pelo feio, já que o feio mesmo nunca fora amado. Certezas que tínhamos ao início do livro: todas já quase todas desvendadas ou comprovadas ou reprovadas. Retratadas algumas.

Buscou consolo no colo de um de seus amantes. Mas consolo flor era dar ao amante algo que não seria por muito tempo. Ele chegou na casa dele e disse que não duraria muito ser gentil. O amante, feliz, feliz de ser tão simples, um humano simples. Era confortável ao pequeno os olhos do humano simples. Os olhos de quem lhe curtia sem precisar detalhar nada de história alguma, de história de nada, de pensar em nada. Fazer sexo, nem isso. Respeitar o corpo do pequeno, viver o pequeno, fazer café pro pequeno, deixar ele fumar na janela. Deixar que ele se calasse.

Daí o amante chega com um sorriso de volta e seu café quente. A porta e a cama. Coisas básicas e o garoto na janela fumando seu cigarro em silêncio. Daí o amante chega, simples, e interrompe tudo. Até então, o pequeno era gentil.

- Eu queria te perguntar uma coisa.

Um suspense, uma sombra nos cílios. O pequeno nem acreditava. Era pra ser tão carnal e casual, ou simplesmente tão casual que não haveria nada a responder, não é? Ele só precisava de um ombro amigo, capaz de engolir seu silêncio. E era irônico precisar compartilhar silêncio com alguém e já estava fazendo muito em dedicar seu silêncio àquele amante. A voz do rico reverberava mil vezes mais mil vezes: você está louco.

Ainda que o pequeno pudessee pensar que de fato quando se conheceram, foi um de seus primeiros encantos, não foi? Mas não. Porque o pequeno já havia enlouquecido pelo feio e já havia recuperado tudo, inclusive a amizade do feio, ou de sua família, ou inclusive ninguém nunca havia pensado que ele enlouquecera durante aqueles quatorze anos. Inclusive havia escrito livros e se tornado artista. E tinha tirado diploma e tinha se tornado um educador. Lembram-se disto? E não precisava de ningúem. No final, em 2008, tivera todas as respostas.

- Você me ama?

Claro que perguntou sem jeito enquanto o pequeno arregalava os olhos de pavor. Qualquer resposta que desse interferiria absurdamente na vida daquele infeliz. Era importante dar-se conta da sua própria dissimulação uma hora. Aquele amante só era importante porque até então ele não te conhecia, não é, pequeno? Mas ele te aceitava, como devia aceitar todas as outras bibas que se deitavam com ele. A única diferença era que ele ainda não tinha galgado o coito que o pequeno prometia, ao longo de alguns meses, até que estivesse preparado. Mas todo amante é tão paciente? Pra quem não tem nada a perder... E pra quem continua a sua vida... E pra quem o o pequeno nunca alimentara nenhuma sorte...

- Eu não sei o que te responder. Eu não queria perder tua companhia. Eu amo tanto a gente, eu amo o mundo não é assim?

- Você entendeu o que quis te dizer. Você já é crescidinho, meu amigo?

- Eu sei. Me desculpa, eu sei, é claro que eu sei. Mas eu não vou te perguntar nada. Eu achei apenas que você estava contente de eu estar aqui e de eu precisar de você.

- É, só que eu também tenho a minha vida. E eu estou passando por algo que talvez você não se importe, mas eu quero definir a minha vida. Eu estou cansado.

O pequeno viu que todo mundo estava cansado.

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